Postagem atualizada em 31/08/2018 às 5h44
Começou nesta quinta-feira (30/08), em Brasília-DF, o Seminário Nacional em Defesa dos Serviços Públicos. Cerca de 250 trabalhadores vão debater até o próximo sábado (01/09) “os impactos das mudanças no Estado Brasileiro e suas consequências para a sociedade”. Diversas categorias e regiões do país estão representadas no evento, que é organizado pelo Fonasefe e pelo Fonacate.
O SINASEFE está representado neste Seminário por diversos sindicalizados de suas seções sindicais e integrantes da Direção Nacional (DN) – que se reunirá imediatamente após o Seminário (nos dias 1 e 2).
Mesa de abertura
Os trabalhos do Seminário foram iniciados por Naara Aragão (Fasubra) que coordenou a abertura junto de Moacir Lopes (Fenasps). A mesa foi composta pelos seguintes representantes de centrais sindicais: Pedro Armengol (CUT), Márcio Costa (Pública), João Paulo Ribeiro (CTB), Anjuli Tostes (Intersindical) e Atnágoras Lopes (CSP-Conlutas).
Pedro Armengol fez uma retomada dos acontecimentos políticos pós-golpe de 2016 (Reformas, Emendas 93 e 95 e entrega do pré-sal). Para ele o golpe teve objetivos claros, dentre os quais o de colocar o Estado para atender o capital rentista. Armengol também denunciou o aprofundamento dos processos de privatização, citando o sistema de saneamento. “Do ponto de vista da privatização, nada é tão ruim que não possa piorar”. Sua preocupação de impedir que as eleições de 2018 homologuem o golpe também foi expressa: “temos convicção de que a sociedade tem clareza do golpe e nosso protagonismo neste momento não deve sair”.
Destacando que não gostaria de discutir as narrativas e sim os efeitos do golpe, Márcio Costa lamentou “o massacre, em dois anos, das conquistas dos trabalhadores dos últimos 200 anos”. Ele destacou a natureza financeira do golpe, que retira dinheiro dos trabalhadores para dar aos grandes conglomerados. Mesmo apresentando um cenário que chamou de “ponte para o inferno”, numa referência ao programa ponte para o futuro de Michel Temer, Márcio destacou que a unidade é a alternativa para os servidores públicos: “construir a unidade não somente em eventos e reflexões, mas na prática, nas ruas”.
João Paulo (JP) iniciou sua intervenção denunciando o avanço do machismo, do fascismo, do racismo e da xenofobia, expressos, também, na eleição de Donald Trump nos EUA. “Na política é necessária tolerância e respeito para unidade e avanços”, destacou ele, lembrando a importância da clareza nas bandeiras que unem as entidades. Para JP, a principal batalha colocada no momento é “vencer as eleições para colocar o país no rumo do respeito e da democracia”.
Denunciando o pagamento da dívida e os avanços da privatização e do entreguismo, Anjuli Tostes rechaçou o projeto de destruição dos serviços públicos em curso no país. “Querem transformar o servidor público em inimigo do povo para defender o estado mínimo, sucatear os serviços públicos e privatizá-los”, destacou. Ela defendeu ainda que os servidores públicos precisam estar permeáveis à participação do povo, pois somente assim é possível ouvir as necessidades da população.
Atnágoras Lopes destacou que a CSP-Conlutas tem acordo com unidade de luta diante dos ataques. Ele traçou um rápido panorama da economia global e lamentou a chamada economia recolonizada do Brasil: “exportamos ferro e compramos trilhos de trem”.
“Não tem saída para o serviço público e para o emprego sem o resgate de bandeiras históricas, como por exemplo a suspensão imediata do pagamento da dívida” lembrou Atnágoras.
Painel 1: orçamento público
Com o tema “Estado, finanças públicas e desenvolvimento”, o primeiro painel do evento foi coordenado por Rudnei Marques (Fonacate e Unacon) e Quelli Rocha (Andes-SN). A exposição inicial foi feita por Evilásio Salvador (UnB), José Celso (Ipea) e Bráulio Cerqueira (Unacon).
Evilásio pautou sua intervenção em pontos como a conjuntura, as desigualdades sociais, o tamanho raquítico do estado brasileiro e a política fiscal. Além de citar Jaime Osório (teórico marxista), comentou também as perseguições aos lutadores e acadêmicos, o processo permanente de contrarreformas e os fundos públicos.
Reafirmando diversas vezes que as finanças refletem as escolhas políticas do Estado, ele defendeu que o orçamento público deve ser para combater as desigualdades sociais. “Sem uma aliança com o povo não há sustentação para os serviços públicos”, afirmou. Salvador apresentou também dados referentes ao tamanho raquítico do estado brasileiro: “a cada 100 pessoas ocupadas, apenas 12 estão no serviço público, em países com desenvolvimento semelhante a média é de 21 pessoas”. Por fim, criticou o montante de recursos destinado ao pagamento de juros da dívida: “nada justifica uma transferência de recursos desta dimensão aos banqueiros, os valores correspondem a 8% do PIB”.
Lembrando que a crise é a regra, e a “diferença é que desta vez seja uma crise mais grave”, José Celso desmentiu o que chamou de “três teses equivocadas sobre o Estado Brasileiro”. Segundo ele, as narrativas que conceituam o Estado Brasileiro como grande, ineficiente e contra o mercado são completamente equivocadas. Confira aqui a apresentação de José Celso em formato PDF.
Além de defender a criação de empregos públicos nos municípios, Celso destacou que para o capital o Estado é grande sim, já que a arrecadação tributária no país “extorque de quem ganha menos e quase não há tributação para os que ganham mais”. Abordando a falsa ineficiência do Estado, lembrou que não há possibilidade de calcular e mensurar o trabalho dos servidores públicos já que não se trata de um setor produtivo e sim que lida com bem-estar da população. “Ainda temos números de servidores públicos federais semelhantes aos de 1991, aproximadamente 650 mil trabalhadores”, destacou. Finalizando a intervenção, denunciou as taxas de juros do Brasil: “a maior carga do mundo”. E lembrou que quanto mais gastos com juros e pagamento da dívida pública, menor o crescimento do PIB.
Denunciando o argumento de que as finanças são apresentadas como restrição às políticas públicas, Bráulio Cerqueira afirmou que o orçamento estatal deve ser o instrumento e não o impedimento destas políticas, e, na maioria das vezes as restrições são autoimpostas pelo Estado. “Durante a crise de 2008 foram emitidos mais de 13 trilhões de dólares em moeda nos países desenvolvidos”, lembrou.
Ele defendeu que a forma de equilibrar as contas públicas em qualquer país é via crescimento econômico e não pelos cortes. “O governo representa 1/3 da economia, quando se reduz gastos também se reduzem vendas e investimentos”, explicou. Também teceu críticas aos governos petistas, que não modificaram legislações como a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Cerqueira lembrou que o governo tem mais de um trilhão de reais em caixa atualmente e que em 2017 o lucro dos bancos teve um aumento de 21%. Confira aqui a apresentação de Bráulio Cerqueira em formato PDF.
Finalizando este primeiro painel do dia, participantes fizeram perguntas aos palestrantes. Paulo Reis (2º tesoureiro), Michel Torres (pasta de comunicação) e Nei Fonseca (Sinasefe IF Sul-RS), do SINASEFE, se posicionaram sobre o tema das finanças públicas.
Painel 2: EC 95/2016
No período vespertino, as atividades do Seminário foram preenchidas com o segundo painel do evento, intitulado “Desmonte do Estado: a Emenda Constitucional nº 95/2016 e suas consequências”.
O painel tem como palestrantes Valério Arcary (IFSP), Max Leno (Dieese), Lineu Neves (Auditoria Cidadã da Dívida) e Charles Alcântara (Fenafisco), sendo mediado por Cláudio Mendonça (Andes-SN) e Poliana Coste (Sinasefe Muzambinho-MG).
Primeiro a falar, Valério Arcary começou conceituando o que seria o “desmonte do Estado”, alertando para o fato de que este não deve definir, de maneira mais rigorosa, a estratégia de luta da classe trabalhadora.
Arcary usou seu conhecimento como historiador para traçar um panorama de como os direitos dos servidores públicos foram desenvolvidos dentro do capitalismo (sobretudo no cenário europeu) enquanto conquistas de duas gerações antes da nossa. Por ter havido uma Revolução Socialista na Rússia e as classes dominantes dos países centrais estarem com um “medo real” de que revoluções se espalhassem, o Estado de Bem-Estar Social foi conquistado pelos trabalhadores. Hoje, sem perigo real de revolução, o que a classe dominante utiliza é a restauração do capitalismo em seu mais alto grau de exploração.
Por conta disso, vemos as condições de trabalho e de vida na Europa se “latinizando” e as condições de trabalho e de vida na América Latina se “asiatizando”, num movimento de precarização global da classe trabalhadora.
Arcary alertou que não há no Brasil nenhuma fração significativa da classe dominante que defenda o aumento dos serviços públicos para a população e que os servidores públicos precisam compreender isso para saber contra qual inimigo estão lutando. Fez questão de deixar claro, por várias vezes, que “quem não sabe contra quem luta, não pode vencer”.
Segundo da mesa a intervir, Max Leno falou que a política fiscal do Estado já está estabelecida na Constituição Federal de 1988 e que a EC 95/2016 foi utilizada para promover um rigor mais intenso no contingenciamento das despesas primárias em detrimento do gasto financeiro.
Leno reforçou, em diversas ocasiões de sua fala, que a EC 95/2016 só trata do congelamento até 2036 das despesas primárias (investimentos em saúde, educação, segurança e demais serviços à população) e que não tocará nos juros e amortizações da dívida pública – que representam o maior percentual de destinação do orçamento anual da União.
Em síntese, a EC 95/2016 tem um objetivo claro: limitar os investimentos públicos em serviços para a população.
Lineu Neves iniciou sua palestra complementando a anterior: “a EC 95/2016 estabeleceu um teto de gastos apenas para as despesas primárias do Estado Brasileiro”. Em sua visão, a Emenda fere vários princípios constitucionais e deveria ser objeto de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn).
Ele usou dados demográficos da ONU, que prevê que até 2030 a população brasileira terá 20 milhões a mais de habitantes, demonstrando que a EC 95/2016 impedirá a vida digna e o acesso a direitos humanos pela população caso não seja revogada.
Por fim, afirmou que os juros e amortizações do sistema da dívida pública (intocáveis pela EC 95/2016) vêm consumindo quase metade dos recursos do Estado e que é necessária uma auditoria desta dívida, conforme previsão constitucional.
E por último Charles Alcântara fez um comparativo da carga tributária do Brasil com a carga tributária de outros países, desmontando vários mitos e demonstrando que nosso país cobra muito no consumo e cobra pouco na renda.
Charles alertou que o discurso de que o Brasil tem “uma das cargas tributárias mais altas do planeta” é falacioso. Apesar de não ser uma carga pequena de tributação, ela se divide de modo anómalo, cobrando pelos produtos consumidos e evitando uma taxação na renda das pessoas (que é onde se mede a capacidade contributiva de cada um), fazendo com quem os mais pobres paguem (proporcionalmente) mais impostos que os mais ricos.
Sobre a EC 95/2016, Charles vaticinou que a Emenda vai ser revogada por conta do país não suportá-la: “nem o governo mais liberal que possa ser eleito suportará esta Emenda, ela não se sustenta”. E defendeu, ainda, a regulamentação do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), previsto na Constituição e ainda não regulamentado.
Por fim, quando a participação do plenário foi chamada às intervenções o SINASEFE teve três representantes entre as 11 falas que foram feitas: David Lobão (coordenador geral), Michel Torres (pasta de comunicação) e José Júnior (Sintef-PB).
Fotos e ao vivo
Confira abaixo fotos do Seminário em nossas peças de cobertura ao vivo publicadas em redes sociais:
- Mesa de conjuntura com as centrais sindicais (5 imagens)
- Painel 1: Estado, finanças públicas e desenvolvimento (3 imagens)
- Debate do Painel 1 (4 imagens)
- Painel 2: Desmonte do Estado – a EC 95/2016 e suas consequências (5 fotos)
- Debate do Painel 2 (3 fotos)
Sobre o evento
O Seminário Nacional em Defesa dos Serviços Públicos tem como temário “O Serviço Público que Queremos” e está em realização, desde esta quinta-feira (30/08), em Brasília-DF. Sediado no San Marco Hotel, o evento possui atividades até o próximo sábado (01/09) e tem como organizadores o Fonacate e o Fonasefe – Fórum do qual o SINASEFE faz parte na condição de membro efetivo. Veja aqui a programação completa do Seminário.
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