Postagem atualizada em 23/01/2020 às 11h45
Na véspera do Natal (24/12), Bolsonaro publicou uma Medida Provisória (MPV) para reduzir a democracia nas Instituições Federais de Ensino (IFEs). Trata-se da MPV nº 914/2019, que altera completamente o processo de escolha dos dirigentes das Universidades Federais, dos Institutos Federais (IFs) e também do Colégio Pedro II.
Esta MPV – editada sem se tratar de “caso de relevância e urgência”, demonstrando a vontade de Bolsonaro de mudar a legislação de maneira autocrática – reduz o peso dos votos de estudantes e técnico-administrativos para 15% cada, alçando os docentes aos 70% de peso e destruindo o modelo paritário dos IFs e do Colégio Pedro II.
Além disso o candidato mais votado não será nomeado à reitoria dos IFs e do Colégio Pedro II: uma Lista Tríplice, do mesmo modelo existente nas Universidades, terá que ser enviada de acordo com o texto da MPV 914/2019. Isso obviamente fará com que Bolsonaro sempre indique o nome que lhe for mais conveniente, mesmo que tenha sido de uma candidatura derrotada – como já fez em algumas Universidades e até mesmo para a Procuradoria Geral da República (PGR), na qual indicou um nome que sequer estava na Lista Tríplice.
Essa Lista Tríplice, contudo, terá uma mudança em relação à regra anterior: ela não será mais enviada pelo Conselho Superior da IFE (composto por representantes da comunidade acadêmica), mas será diretamente formada pelos três primeiros colocados da eleição.
Outro ponto controverso que a MPV 914/2019 traz é o fim das eleições para diretores dos campi. Estes dirigentes, a partir da vigência da MPV, serão indicados pela reitoria.
A MPV 914/2019 é um completo retrocesso à democracia da Rede Federal de Educação e precisa ser derrotada! Sua normatização retrocede as liberdades democráticas e impõe um autoritarismo institucionalizado do governo sobre as IFEs. Além de ser mais uma demonstração da utilização abusiva do instrumento da Medida Provisória por Bolsonaro: só em 2019 já foram publicadas mais de 30 MPVs (a maioria nem sequer chegou a ser votada).
Vamos à luta para anular esta MPV!
Principais ataques
- A eleição dos reitores dos IFs e do Colégio Pedro II ocorre diretamente pelos estudantes, técnico-administrativos e professores em uma relação de peso paritária, de 33,33% para cada segmento.
- Modificação: altera os pesos e acaba com a paridade. Agora docente vale 70%, técnico-administrativo vale 15% e estudante vale 15%.
- Não existe Lista Tríplice para a eleição dos reitores dos IFs e do Colégio Pedro II. O mais votado deve ser o nomeado.
- Modificação: cria a Lista Tríplice para os IFs e o Colégio Pedro II, podendo nomear para a reitoria um candidato que tenha sido derrotado na eleição.
- Os diretores dos campi são eleitos pelas comunidades acadêmicas.
- Modificação: acaba com a eleição para os diretores dos campi.
- O reitor pode apresentar a equipe de pró-reitores durante a campanha, junto da apresentação da chapa.
- Modificação: a eleição será apenas no nome do reitor e essa apresentação não poderá mais ser feita.
- Podem se candidatar à reitoria professores doutores ou enquadrados nos últimos níveis da carreira.
- Modificação: agora apenas doutores e que estejam enquadrados nos últimos níveis podem se candidatar. Os critérios ficaram mais restritos.
- Enquanto o novo reitor não é nomeado, o reitor anterior permanece no cargo até a definição da homologação da eleição.
- Modificação: poderá ser indicada pelo governo qualquer pessoa para ser reitor pro tempore.
Texto da MPV 914/2019
Confira abaixo a íntegra do texto da Medida Provisória nº 914/2019:
Medida Provisória nº 914, de 24 de dezembro de 2019
Dispõe sobre o processo de escolha dos dirigentes das universidades federais, dos institutos federais e do Colégio Pedro II.
O Presidente da República, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei:
Objeto e âmbito de aplicação
Art. 1º Esta Medida Provisória dispõe sobre o processo de escolha dos dirigentes das universidades federais, dos institutos federais e do Colégio Pedro II.
Obrigatoriedade da consulta
Art. 2º É obrigatória a realização de consulta à comunidade acadêmica para a formação da listra tríplice para o cargo de reitor para submissão ao Presidente da República por meio do Ministro de Estado da Educação.
Procedimento da consulta
Art. 3º A consulta para a formação da lista tríplice para reitor será:
I – por votação direta, preferencialmente eletrônica;
II – com voto em apenas um candidato;
III – para mandato de quatro anos;
IV – com voto facultativo; e
V – organizada por colégio eleitoral instituído especificamente para esse fim.
§ 1º A consulta terá como eleitores:
I – os servidores efetivos do corpo docente lotados e em exercício na instituição, com peso de setenta por cento;
II – os servidores efetivos técnico-administrativos lotados e em exercício na instituição, com peso de quinze por cento; e
III – os integrantes do corpo discente matriculados nos cursos de ensino médio, técnico, de graduação e pós-graduação, presenciais ou a distância, com peso de quinze por cento.
§ 2º O percentual de votação final de cada candidato será obtido pela média ponderada dos percentuais alcançados em cada segmento de que trata o § 1º.
§ 3º Para o cálculo do percentual obtido pelo candidato em cada segmento, será considerada a razão entre a votação obtida pelo candidato no segmento e o quantitativo total de votos válidos do segmento.
Requisitos para se candidatar
Art. 4º Somente podem se candidatar ao cargo de reitor os docentes ocupantes de cargo efetivo na respectiva instituição federal de ensino que:
I – possuam o título de doutor ou estejam posicionados:
a) na Classe D ou na Classe E da Carreira do Magistério Superior, no caso das universidades federais; ou
b) na Classe DIV ou na Classe Titular da Carreira do Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, no caso dos institutos federais e do Colégio Pedro II; e
II – não estejam enquadrados nas hipóteses de inelegibilidade previstas no inciso I do caput do art. 1º da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990.
Parágrafo único. O reitor e aquele que o houver sucedido ou substituído no curso do mandato por mais de um ano não poderá ser nomeado para mais de um período sucessivo.
Afastamento durante a candidatura
Art. 5º O candidato a reitor fica automaticamente afastado de cargo em comissão ou função de confiança exercida na respectiva instituição federal de ensino a partir da data de homologação da candidatura.
Parágrafo único. O afastamento de que trata o caput ocorrerá:
I – com prejuízo da remuneração do cargo em comissão ou da função de confiança;
II – com manutenção das parcelas remuneratórias permanentes;
III – sem dispensa das atividades do cargo efetivo; e
IV – até a homologação da consulta pelo Conselho Superior ou pelo colegiado máximo da instituição.
Escolha e nomeação dos reitores
Art. 6º O reitor será escolhido e nomeado pelo Presidente da República entre os três candidatos com maior percentual de votação.
§ 1º Na hipótese de um dos candidatos a reitor que componha a lista tríplice desistir da disputa, não aceitar a nomeação ou apresentar óbice legal à nomeação, a lista tríplice será recomposta com a inclusão de outros candidatos até completar o número de três e seguirá a ordem decrescente do percentual obtido na votação.
§ 2º O reitor escolherá o vice-reitor dentre os docentes que cumpram os requisitos previstos no art. 4º, que será nomeado pelo Presidente da República para mandato para período coincidente ao do titular.
§ 3º Os demais ocupantes de cargos em comissão e funções de confiança na instituição de ensino serão nomeados ou, conforme o caso, designados pelo reitor.
§ 4º A competência prevista no caput é indelegável.
Designação de reitor pro tempore
Art. 7º O Ministro de Estado da Educação designará reitor pro tempore nas seguintes hipóteses:
I – na vacância simultânea dos cargos de reitor e vice-reitor; e
II – na impossibilidade de homologação do resultado da votação em razão de irregularidades verificadas no processo de consulta.
Escolha de dirigentes
Art. 8º Os campi serão dirigidos por diretores-gerais, que serão escolhidos e nomeados pelo reitor.
Parágrafo único. Poderão ser nomeados para o cargo de diretor-geral de campus os servidores ocupantes de cargo efetivo da carreira docente ou de cargo efetivo de nível superior da carreira dos técnico-administrativos do Plano de Carreira dos Cargos Técnico-Administrativos em Educação que:
I – possuam, no mínimo, três anos de efetivo exercício em instituição federal de ensino; e
II – não estejam enquadrados nas hipóteses de inelegibilidade previstas no inciso I do caput do art. 1º da Lei Complementar nº 64, de 1990.
Escolha de diretor de unidade
Art. 9º Os diretores e os vice-diretores das unidades serão escolhidos e nomeados pelo reitor para mandato de quatro anos dentre os servidores efetivos do quadro docente de instituição de ensino que:
I – possuam o título de doutor ou estejam posicionados na Classe D ou na Classe E da Carreira do Magistério Superior; e
II – não estejam enquadrados nas hipóteses de inelegibilidade previstas no inciso I do caput do art. 1º da Lei Complementar nº 64, de 1990.
§ 1º Ficam dispensadas do cumprimento do disposto no inciso I do caput as unidades que tenham sido instaladas há menos de cinco anos.
§ 2º O diretor e aquele que o houver sucedido ou substituído no curso do mandato por mais de um ano não poderá ser nomeado para mais de um período sucessivo.
Sistema eletrônico para as consultas
Art. 10. Ato do Ministro de Estado da Educação disporá sobre critérios para assegurar a integridade, a confidencialidade e a autenticidade dos processos de votação eletrônica para os fins do disposto nesta Medida Provisória.
Parágrafo único. Até a implementação dos processos de votação eletrônica, nos prazos definidos no ato de que trata o caput, caberá a cada instituição federal de ensino definir e adotar os procedimentos para realização do processo de votação.
Disposição transitória
Art. 11. O disposto nesta Medida Provisória não se aplica aos processos de consulta cujo edital, em conformidade com a legislação anterior, tenha sido publicado antes da data de entrada em vigor desta Medida Provisória.
Revogações
Art. 12. Ficam revogados:
I – o art. 16 da Lei nº 5.540, de 28 de novembro de 1968;
II – a Lei nº 9.192, de 21 de dezembro de 1995; e
III – os seguintes dispositivos da Lei nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008:
a) o § 1º do art. 11;
b) os art. 12 e art. 13; e
c) o § 2º do art. 14.
Vigência
Art. 13. Esta Medida Provisória entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília-DF, 24 de dezembro de 2019
198º da Independência e 131º da República
Jair Messias Bolsonaro
Antonio Paulo Vogel de Medeiros
Este texto não substitui o publicado no DOU de 24/12/2019 (edição extra).