Postagem atualizada em 24/03/2020 às 9h13
O Brasil amanheceu perplexo! Na noite de ontem (22/03), o governo Bolsonaro lançou a MPV 927/2020, que permite aos patrões a suspensão da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e o não pagamento de salários por até 120 dias – curiosamente o prazo máximo pelo qual a Medida Provisória pode vigorar, caso não seja aceita pelo Congresso Nacional.
A proposta inicial do governo, que circulou na semana passada, era de corte de até 50% dos salários (não podendo ser pago valor inferior ao salário mínimo – R$ 1045,00). A realização da sua proposta, via MPV 927/2020, conseguiu ser ainda pior e mais perversa!
Além dessa crueldade contra os trabalhadores da iniciativa privada, o governo já mira novo ataque contra os servidores públicos, buscando mecanismos de aprovação imediata da PEC Emergencial (que propõe a redução de salários e jornadas em até 25%) ou a criação de um dispositivo infralegal – que ignore o princípio constitucional da irredutibilidade salarial! – que permita o Estado a reduzir os salários dos servidores entre 10% (para quem ganha até R$ 10 mil) e 20% (para quem ganha mais de R$ 10 mil).
Tudo isso num momento onde a população (em quarentena e confinamento) não pode protestar nas ruas e, ainda, num período decretado pelo próprio governo como calamidade pública. Ou seja, quando os trabalhadores mais precisam de seus salários para suas subsistências (alimentação, remédio, aluguel etc), o governo os coloca em situação de desproteção, de abandono e de insuficiência de renda.
É a proteção do empresariado acima de tudo e dos privilégios das elites brasileiras acima de todos! Enquanto fala em crise econômica e impõe sacrifícios aos trabalhadores (sacrifícios que podem levar muitos à morte!), o governo sequer levanta a hipótese de tributação de grandes fortunas e heranças; de novo imposto sobre grandes lucros e dividendos; e de redução dos salários dos políticos. E ainda finge que “está tudo bem” com o uso do cartão corporativo da Presidência da República – que contabiliza uma média de gastos de R$ 41 mil por dia e tem esses gastos em sigilo.
A MPV 927/2020, nas palavras do Senador Paulo Paim (PT-RS), “traz inúmeros absurdos, entre eles: quem for afastado por quatro meses ficará sem salário e não terá direito ao seguro desemprego e quem está na informalidade (45 milhões) não tem direito a uma renda básica”.
Enxergamos com perplexidade essa violência contra a população brasileira! As pessoas que estão confinadas para não morrer com o coronavírus, sem poder trabalhar inclusive por força dos Decretos dos diversos governos estaduais, poderão morrer de fome ou nas ruas, sem dignidade, despejadas de suas moradias por falta de pagamentos de aluguéis e financiamentos.
A Medida Provisória de Bolsonaro vai na contramão do que o mundo tem feito. Nos Estados Unidos, Donald Trump já anunciou pacote de ajuda às pequenas empresas e US$ 3 mil para as pessoas ficarem em casa. Na Inglaterra, Boris Johnson anunciou que o governo vai ajudar as empresas a pagar os salários dos funcionários para evitar demissões. E estamos aqui dando exemplos de dois países chefiados politicamente por representantes da extrema-direita!
Aqui no Brasil, onde a economia é mais frágil, os salários são mais baixos e a população já estava à margem da dignidade – trabalhando de maneira autônoma e precarizada – temos mais necessidade ainda de intervenção do Estado na economia para socorrer os que vivem da venda da força de trabalho, não para puni-los com suspensão de sua legislação protetiva e deixá-los à míngua.
A Organização das Nações Unidas (ONU) recomendou a adoção de Renda Mínima Universal pelos países durante a pandemia do coronavírus – o Ministério da Economia sequer falou dessa proposta.
Bolsonaro aplica, neste momento, a mais perversa forma de necropolítica. As pessoas mais pobres que não morrerem da COVID-19, morrerão da crise econômica que o governo está acentuando. Isso é muito grave e precisa ser denunciado!
Servidores públicos
A PEC Emergencial (PEC 186/2019) está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Apesar das pressões de Bolsonaro e Paulo Guedes, a Senadora Simone Tebet (MDB-MS) afirmou que a mesma não será votada de maneira virtual dentro da Comissão.
A PEC 186/2019 ainda está na CCJ e não foi apreciada pelo plenário da Casa (precisa ser aprovada em dois turnos). Se aprovada, ainda precisa tramitar na Câmara dos Deputados.
De toda forma, propostas infralegais para redução dos salários dos servidores públicos nos moldes do que está sendo proposto para os servidores da iniciativa privada estão “em estudo” pelo Ministério da Economia.
O Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou, em agosto do ano passado, que reduzir salários e jornadas dos servidores públicos é inconstitucional. Entretanto, sabemos que não estamos diante de um governo que respeita a constituição e os trabalhadores na hora de aplicar suas perversidades. É hora de ficar em casa, mas em estado de mobilização!